Legalidade da
Proteção Veicular

A Constituição Federal Brasileira dispõe, no inc. XVII, art. 5, que é plena a liberdade de associação para fins lícitos, proibindo apenas as associações de caráter paramilitar. O inc. XVIII do citado artigo constitucional aborda a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas, que independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seus funcionamentos. A presença desses dois dispositivos na Carta Magna de 1988 deixa claro que a Assembleia Constituinte reconheceu a grande importância do associativismo no país, bem como se preocupou com a defesa do mesmo, tanto que, expressamente, só impôs duas limitações constitucionais à liberdade de associação, ambas relacionadas às suas finalidades e previstas no artigo 5º, inciso XVII, da CF/88, que são percorrer fins ilícitos e ter caráter paramilitar, bem como deu às mesmas duas garantias coletivas: vedou a interferência estatal no funcionamento das associações e estabeleceu que só podem ser dissolvidas compulsoriamente ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial transitada em julgado. A associação de pessoas é fruto da liberdade de associação presente em nossa constituição.Segundo o ilustre professor Carlos Ayres Britto, “o direito constitucional de se associar é do tipo individual, mas de exercício necessariamente plural ou coletivo e decorre da liberdade de associação”. O mestre Ayres Britto define Associação como “pessoas jurídicas civis ou não mercantis, voluntariamente e espontaneamente constituídas, por pessoas físicas, em seu formato mais simples e no uso da autonomia de vontade em que se constitui a liberdade individual de se autodeterminar juridicamente. Logo, as associações com direta expressão da liberdade individual que se consorcia com a outra(s) para o alcance de um objetivo comum”. Verifica-se ser a liberdade individual, nos países de regime democrático, um importante princípio constitucional, guardando valores fundamentais da ordem jurídica dos mesmos. Ela decorre do princípio geral do direito “liberdade”, e se constitui como um dos principais princípios da democracia. Desde a introdução da liberdade associativa como direito fundamental na Constituição de 1891, as associações contribuem com o desenvolvimento econômico, político e social do Brasil. As associações de proteção patrimonial e automotiva surgiram em todo o país, sobretudo na última década, representando, atualmente, uma verdadeira engrenagem socioeconômica, empregando dezenas de milhares de pessoas, produzindo milhões de reais em riqueza para o Brasil e, mais do que isso, dando amparo aos milhões de brasileiros com menor poder aquisitivo, via de regra inseridos na chamada classe “C”, que não possuem a menor condição de usarem o seguro patrimonial ou automotivo ofertados no mercado securitário. Salienta-se que a impossibilidade de utilizar o mercado securitário advém do fato de não possuírem dinheiro suficiente para tanto ou por terem os seus dados pessoais lançados nos bancos de dados de restrição ao crédito. Encurralados entre a extrema necessidade de terem os seus veículos protegidos e a impossibilidade de contratarem um seguro é que surgem as associações de proteção patrimonial, na qual as pessoas, em grande maioria com poder aquisitivo menor, se uniram para mutuamente protegerem os seus patrimônios, em especial, veículos, rateando as despesas entre si. O mutualismo que se pratica nas associações de proteção patrimonial não é igual ao mutualismo que se tem no contrato de seguro; há clara e nítida distinção. No contrato de seguro é feito o cálculo atuarial da sinistralidade e acrescentado o lucro da seguradora, existindo, dessa forma, um mutualismo impuro, podendo ser dito que há a socialização do possível prejuízo (risco) e a privatização do lucro para as seguradoras. Já nas associações de proteção automotiva o mutualismo praticado é puro, pois há a socialização (rateio) dos prejuízos, esses já certos e determinados, sem haver lucro, possibilitando a cada associado um custo mensal bem inferior ao praticado pelas companhias seguradoras. Salienta-se que a qualidade dos serviços prestados depende única e exclusivamente da gestão pelos próprios associados, estando todos cientes das possíveis vantagens e desvantagens dessa proteção. Em aprimorada distinção entre associações patrimoniais e seguradoras, encontramos no parecer jurídico confeccionado pelo professor Ayres Britto uma das mais perfeitas análises jurídicas. Segundo o citado mestre, o “seguro compõe um centrado ramo de negócio desenvolvido no horizonte econômico do mercado, operando com base em rigorosos métodos atuariais que são submetidos à efetiva fiscalização estatal com o objetivo de garantir a saúde financeira e a aptidão jurídica da extensa rede de relações securitárias por todo o país”. Já nas associações de proteção patrimonial, gênero da qual as associações de proteção veicular são espécies, o que se tem, ainda segundo Ayres Britto, é “um ambiente restrito e concentrado, em que os riscos e as respectivas garantias são compartilhados a partir do pleno conhecimento do universo patrimonial envolvido, o que se dá pela adesão voluntária a uma relação jurídica de base, de índole estatutária, vínculo pelo qual se desenvolve um peculiar formato de autogestão de riscos. Um válido modelo de garantia recíproca, elaborado e tocado pelos associados e para os associados, com processos deliberativos tão transparentes quanto participativos, sempre com o olhar atento do próprio dono”. Conclui-se, portanto, que as associações de proteção patrimonial são, em síntese, a expressão do direito à liberdade individual exercida de forma plural, coletiva, honesta e harmoniosa pelo povo brasileiro, criando riquezas para a nossa nação, empregando e protegendo o patrimônio daqueles que não podem pagar ou que são rejeitados pelas seguradoras. No dizer do incomparável professor Ayres Britto, “contrato de seguro e proteção veicular são como água e óleo: não se misturam”